30/06/14

© Teresa Nabais


"Não há uma fronteira nítida entre a imaginação e a recordação. Quando oiço um paciente, não estou a reconstruir os «factos» de uma história, estou atento aos padrões, à cadeia de emoções e às associações que nos podem orientar no sentido de evitar a repetição do sofrimento e que nos podem conduzir a uma compreensão articulada. Como Inga disse, nós construímos as nossas narrativas e essas histórias criadas são inseparáveis da cultura que vivemos. Às vezes, no entanto, há fantasias, delírios ou invenções inequívocas que se fazem passar por autobiografia. Torna-se necessário, então, fazer uma distinção mínima entre o que são factos e o que são ficções. A dúvida é um sentimento desconfortável..."

Siri Hustvedt, in Elegia para um Americano

29/06/14

EUA - transporte público, 1955

Isabel Salema: Ao tratar um tema como o racismo sentiu que era necessário fazer alguma sinalização moral num tema que é difícil e polémico. Teve medo que ao tratar um tema como o racismo o acabasse por justificar?
Francisco Bethencourt: Não, pelo contrário. O que eu tentei foi tratá-lo de uma maneira objectiva. Daí o cuidado que tive, e reflecti durante anos, sobre a noção de racismo, sobre a noção de raça, sobre esta tese de o racismo ser motivado por projectos políticos. Tudo isto levou tempo a amadurecer. Foi um livro que levou bastante tempo a ser concebido, a ser realizado, e resultou muito de uma prática de pesquisa. Procurei ter uma linguagem objectivada, utilizar o menos possível adjectivos e uma linguagem emocional. Do ponto de vista analítico, o livro é bastante seco. Procurei também não entrar em polémicas desnecessárias.
É evidente que tenho a minha ética e uma visão política de tudo isto, e tenho a plena convicção que estes problemas têm que ser afrontados, discutidos. Tem que haver uma certa consciência histórica do passado que não passa por ignorar problemas e metê-los debaixo do tapete.
Porque há uma concepção da direita portuguesa segundo a qual falar do racismo é um crime de lesa-pátria e eu acho que prejudica profundamente a pátria ignorar [estes problemas], fingir que eles não existem. Ou, pior do que isso, projectar uma imagem de harmonia que nunca existiu.
Isabel Salema: Porque é que prejudica?
Francisco Bethencourt: Uma comunidade histórica só progride se tiver uma relação de honestidade com o seu próprio passado. Os passados de qualquer país não são limpos e assépticos.

28/06/14

© Saul Leiter

"A memória presenteia-nos apenas quando o presente a sacode. Não é um armazém com imagens e palavras fixas mas uma rede dinâmica de associações que nunca está parada e é sujeita a revisão sempre que recuperamos uma velha imagem ou palavras antigas."

Siri Hustvedt, in Elegia para um Americano

22/06/14

Tu és aquilo que as tuas palavras ouvem,

Sylvain Estibal | When Pigs Have Wings, 2011


ouves o teu coração (as tuas palavras "o teu coração")?

Manuel António Pina

21/06/14

beijo-te, não é?

© Lauren Fleishman 


 nada estava escrito,
nenhuma verdade comum aos planetas,
éramos só nós sem nenhum segredo,
vivos e completos, serenos, mortais”

António Franco Alexandre 

17/06/14

© Gerhard Richter 

"O único fenómeno estranho ao instinto de sobrevivência que manda em qualquer pessoa, animal ou anjo que exista, é o amor."  

Gonçalo M. Tavares

14/06/14

Rodriguez in Searching for Sugar Man, 2012


"What he's demonstrated, very clearly, is that you have a choice. He took all that torment, all that agony, all that confusion and pain, and he transformed it into something beautiful. He's like the silkworm, you know? You take this raw material, and you transform it. You come out with something that wasn't there before. Something beautiful. Something perhaps transcendent. Something perhaps eternal. Insofar as he does that, I think he's representative of the human spirit, of what's possible. That you have a choice "And this has been my choice, to give you Sugar Man". Now, have you done that? Ask yourself." 

Rick Emmerson, in Searching for Sugar Man

13/06/14

© Duane Michals


"The work of psychoanalysis can turn ghosts into ancestors." 

Hans Loewald

12/06/14

"Por que é que tenho a sensação de carregar um segredo no corpo como um embrião, mudo e informe, para lá do conhecimento? E por que é que sinto que ele pode entrar em erupção, explodir, se eu não o controlar? Deve ser fácil, tão fácil preencher esse desassossego húmido e asfixiante com palavras, descrever a agitação, escrever uma história que explique o porquê da sua existência."

Siri Hustvedt, in O Mundo Ardente


11/06/14

© Charles H. Traub

"Porque a amizade (já o disse antes) não é uma dádiva do céu, é uma espécie de tesouro escondido onde só se alcança depois de ter vencido caminhos e tempestades, e ter enfrentado monstros e gigantes, e ter atravessado florestas e subido montanhas, mil vezes soçobrando e mil vezes recomeçando de novo a partir da solidão e do exílio. E porque cada um de nós pode, acerca dos amigos, dizer como nos ahadith: "Eu era um tesouro escondido e por eles fui revelado..."  

Manuel António Pina, in Por outras palavras 

10/06/14

© Maria | Fernando, 2012


Roger Scruton: É isso que é o amor. Não há nenhuma resposta clara para isso. Quando se reconhece que há alguém mais importante que nós, decidimos, se pudermos, ligar as duas vidas uma à outra. (...) Há um ponto em que a razão expira, em que as opções deixam de ser racionais. Devemos usar a razão, mas não para além do ponto em que ela perde o sentido. E claro, um casamento ou uma relação entre pessoas, obriga-nos a pensar muitas coisas. Mas chega a altura em que todas as razões pró e contra se esgotaram e só nessa altura nos rendemos à vida e ela se torna uma coisa de suprema importância, mas é a vida de um ser consciente de si próprio, não apenas um animal. (...) Ter este sentimento para com outra pessoa e estarem ambos preparados para isto, já é automaticamente viver acima dessa rotina quotidiana, sair dela e experimentar algo sublime."

09/06/14

© Annette Messager | Mes Voeux, 1989

...
afinal a vida é relatável
é preciso é perder o medo de contar
o que se passa entre portas
onde se passa tudo o que deveras importa
e nalguns casos é só o que existe
pois a maioria dos humanos
teve só vida e pouca obra
mas ter  vida é uma imensidão de possibilidades
narradas ou não
...

Rosa Oliveira, in Cinza


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