28/05/13

"Mas penso que tudo isto é uma interminável preparação, uma aproximação. Porque o prestígio da poesia é menos ela não acabar nunca do que propriamente começar. É um início perene, nunca uma chegada seja ao que for. E ficamos estendidos nas camas, enfrentando a perturbada imagem da nossa imagem, assim, olhados pelas coisas que olhamos. Aprendemos então certas astúcias, por exemplo: é preciso apanhar a ocasional distracção das coisas, e desaparecer; fugir para o outro lado, onde elas nem suspeitam da nossa consciência; e apanhá-las quando fecham as pálpebras, um momento, rápidas, e rapidamente pô-las sob o nosso senhorio, apanhar as coisas durante a sua fortuita distracção, um interregno, um instante oblíquo, e enriquecer e  intoxicar a vida com essas misteriosas coisas roubadas." Herberto Helder, in Servidões

© Daniel Blaufuks | O Ofício de viver, 2010

2 comentários:

  1. Para onde quer que vás, levas as promessas na ponta dos dedos. É a tua última oportunidade, a quem chamaram esperança, alguém impreparado de olhos fechados.

    Beijo-te,

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. "Compreendi então: cumprira-se aquilo que eu sempre desejara - uma vida subtil, unida e invisível que o fogo das imagens devorava. Era uma vida que absorvera o mundo e o abandonara depois, abandonara a sua realidade fragmentária. Era compacta e limpa. Gramatical." Herberto Helder, in Servidões

      Beijo-te,

      Eliminar