29/06/14

EUA - transporte público, 1955

Isabel Salema: Ao tratar um tema como o racismo sentiu que era necessário fazer alguma sinalização moral num tema que é difícil e polémico. Teve medo que ao tratar um tema como o racismo o acabasse por justificar?
Francisco Bethencourt: Não, pelo contrário. O que eu tentei foi tratá-lo de uma maneira objectiva. Daí o cuidado que tive, e reflecti durante anos, sobre a noção de racismo, sobre a noção de raça, sobre esta tese de o racismo ser motivado por projectos políticos. Tudo isto levou tempo a amadurecer. Foi um livro que levou bastante tempo a ser concebido, a ser realizado, e resultou muito de uma prática de pesquisa. Procurei ter uma linguagem objectivada, utilizar o menos possível adjectivos e uma linguagem emocional. Do ponto de vista analítico, o livro é bastante seco. Procurei também não entrar em polémicas desnecessárias.
É evidente que tenho a minha ética e uma visão política de tudo isto, e tenho a plena convicção que estes problemas têm que ser afrontados, discutidos. Tem que haver uma certa consciência histórica do passado que não passa por ignorar problemas e metê-los debaixo do tapete.
Porque há uma concepção da direita portuguesa segundo a qual falar do racismo é um crime de lesa-pátria e eu acho que prejudica profundamente a pátria ignorar [estes problemas], fingir que eles não existem. Ou, pior do que isso, projectar uma imagem de harmonia que nunca existiu.
Isabel Salema: Porque é que prejudica?
Francisco Bethencourt: Uma comunidade histórica só progride se tiver uma relação de honestidade com o seu próprio passado. Os passados de qualquer país não são limpos e assépticos.

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