27/03/13

© Daniel Mordzinski | Gonçalo M. Tavares


Pedro Mexia: É talvez o único assumido "escritor de ideias" da sua geração. Diria que isso tem a ver sobretudo com a sua personalidade ou mais com as suas leituras?
Gonçalo M. Tavares: É impossível distinguir personalidade e leituras, ou personalidade e experiências. E neste particular, é claro que as leituras são uma experiência muito importante. Detesto a ideia de que a leitura não seja uma experiência de vida. Como se saíssemos da vida para ler um livro e, depois da leitura, voltássemos desse sítio obscuro, de novo para a vida. Como se o acto de leitura fosse realizado num gabinete fechado. Acho que todos sabemos que não é assim. Há livros, e o conjunto de livros que se leu ainda tornam isto mais intenso, que mudam radicalmente a personalidade. É evidente também que há experiências de vida, biográficas, com uma dimensão decisiva no meu percurso - e no percurso de todos. Sobre isto guardo um certo pudor. Pode parecer estranho, pois tenho a imagem de alguém muito cerebral, mas escrevo instintivamente. Quando as coisas correm bem escrevo sem pensar em nada. Nunca penso antes de escrever. Tento que o pensamento coincida exactamente com o acto de escrita - não estão separados no tempo. Nunca planeio ou projecto. Quando começo um livro não sei que personagens vão existir, não sei o que lhes vai acontecer. Se já sei o que vou escrever, não escrevo. A minha escrita é claramente para mim um acto de investigação, tentar descobrir o que não sei.

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