© Marcelo Buainain |
"Uma mulher encosta-se a um muro,
encosta-se à memória. Veste de uma maneira simples, uma blusa, uma saia
cobrindo os joelhos, talvez uns tamancos. Tem ainda, amarrado à cabeça, um
lenço negro, negros aliás e brancos todos os tons em que se veste, negros os
tamancos, um casaco de lã sobre a blusa, negras ainda algumas das riscas da
saia, brancas as outras, como a blusa. Encosta-se ao muro aonde cola as costas,
os ombros e depois uma das faces, assim é mais fácil ver-lhe o rosto. As mãos
encostá-las-ia também se não segurasse um lenço branco. Aperta-o entre os
dedos, fá-lo passar entre eles, uma pequena serpente. Ou então amarrota-o, faz
das palmas das mãos uma concha onde o esconde, o lenço assim desaparece
totalmente, apenas as mãos se vêem projectadas para a frente, dir-se-ia que
rezam. Depois sempre ocultando o lenço, levam-no ao rosto novamente de perfil,
tudo a preto e branco ainda, ou é o rosto que desce até às mãos, mergulha no
lenço, talvez este e a língua se procurem, uma língua pelo lenço adiante, uma
língua é provável que vermelha, não, é tudo ainda muito a preto e branco, é
tudo ainda demasiado a preto e branco para permitir um pormenor vermelho."
Luís Miguel Nava, in Películas
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